Por que Bolsonaro ainda não vestiu a camisa do São Paulo
Por Breiller Pires
Em seu expediente de tirar proveito político do futebol, o presidente Jair Bolsonaro já se exibiu publicamente vestindo camisas de 74 clubes brasileiros, incluindo equipes pouco conhecidas, como Arapongas (PR), Hercílio Luz (SC) e Real Brasília (DF), e 11 dos 12 maiores times do país. A única exceção entre eles, de acordo com levantamento do pesquisador da Universidade Federal do Paraná e editor do Ludopédio, Victor Figols, é o uniforme do São Paulo.
“Existem algumas hipóteses que podem explicar por que Bolsonaro ainda não vestiu a camisa do São Paulo”, aponta Figols. “Uma delas, a homofobia, já que o clube é estigmatizado por rivais com brincadeiras homofóbicas. E o presidente tem um perfil muito atrelado à ideia de masculinidade, inclusive com histórico de falas ofensivas a pessoas LGBTs.”
Apesar de se dizer palmeirense, o presidente já vestiu camisas de Flamengo, que tem rivalizado com o alviverde paulista pelo protagonismo nacional nos últimos anos, e até mesmo de arquirrivais como o Corinthians, em encontro com o ex-jogador Marcelinho Carioca, no ano passado.
Já em 2019, numa visita ao amigo Luiz Felipe Scolari, então treinador do Palmeiras, Bolsonaro fez uma piada homofóbica ao se referir a seu cachorro de estimação. “Pior se fosse um bambi”, disse o presidente, em alusão ao apelido pejorativo usado por rivais para se referir a torcedores do São Paulo.
No último sábado, o cantor sertanejo Zé Neto, bolsonarista declarado, pediu desculpas após ter vestido a camisa tricolor durante uma live, como pagamento de uma aposta, e imitado trejeitos associados a homossexuais ao falar sobre o clube.
Segundo Figols, outro suposto motivo de o presidente ainda não ter aparecido em público com o uniforme do São Paulo tem contornos políticos. “Ele não encontrou tanta receptividade nem portas abertas como em outros times”, afirma o pesquisador. As últimas gestões do clube paulista sempre tiveram integrantes pouco simpáticos à figura de Bolsonaro.
Ao longo do mandato de Carlos Augusto Barros e Silva, o Leco, o ex-diretor executivo Raí se notabilizou por tecer críticas contundentes ao presidente da República, até mesmo exigindo sua renúncia, no ano passado, devido à má condução do Governo no controle da pandemia de covid-19. Apesar das pressões de conselheiros, a gestão de Leco jamais censurou o posicionamento político do ídolo são-paulino, além de ter abraçado campanhas sociais de viés progressista, como um manifesto contra a homofobia.
Na administração atual, capitaneada por Julio Casares, o foco de resistência a uma eventual aproximação com o Planalto é o sucessor de Raí no cargo, Carlos Belmonte. O jornalista, que é conselheiro do clube desde 2014, não esconde sua oposição aos ideais bolsonaristas e à possibilidade de que o São Paulo seja utilizado para fins políticos.
Com a imagem distante de Bolsonaro, o clube segue sem emitir gestos diplomáticos em direção a Brasília. Recentemente, a diretoria anunciou uma homenagem a Richarlyson, como forma de reparação pela perseguição homofóbica que sofreu em sua passagem pela equipe.
Nas redes sociais, o presidente Casares fez questão de negar o boato de que teria convidado Bolsonaro para uma visita ao Morumbi. A depender da vontade de uma ala influente na atual gestão, o manto tricolor continuará imune ao oportunismo presidencial.