De Araraquara ao topo do continente: Ferroviária e os três milagres de 2020

Guerreiras Grenás contrariaram expectativas, operaram "três milagres" e conquistaram a Libertadores Feminina 2020
Guerreiras Grenás contrariaram expectativas, operaram "três milagres" e conquistaram a Libertadores Feminina 2020 / Pool/GettyImages
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De Araraquara para o topo do continente. Essa foi a estrada que a Ferroviária pegou não uma, mas duas vezes em sua história. Gostando você ou não dos enredos cinematográficos de superação, o ano 2020 teve uma quantidade tão extensa de altos e baixos que a conquista ficou ainda mais gigantesca - assim como o próprio clube...

Antes de pegar o trem rumo à nossa parábola, precisamos relembrar qual era o pano de fundo dos anos de 2020 e 2021: Covid-19. As vacinas ainda eram vislumbres prematuros no horizonte distante, as lives eram populares e nós lutávamos todos os dias para tentar manter a sanidade mental. Lembrou? Impossível esquecer, certo?

Covid-19 Ferroviária Libertadores
Competições de 2020 e 2021 tiveram o auge da pandemia da Covid-19 como doloroso pano de fundo / MARCELO ENDELLI/GettyImages

Foi nesse contexto de competições inteiras adiadas que a Locomotiva fez Buenos Aires conhecer o tango do interior de São Paulo. Cronologicamente falando, o Brasileirão Feminino 2020 veio primeiro. No principal torneio nacional brasileiro, as Guerreiras Grenás foram eliminadas nas quartas de final, quando encontraram o novato, porém cascudo, Palmeiras.

No entanto, a vaga na Libertadores estava garantida, afinal, o protocolo da classificação é referente ao ano anterior, ou seja, foi através do Brasileiro de 2019 que a Ferroviária, campeã naquela edição, assegurou presença no campeonato continental em 2020. E assim as comandadas da histórica Lindsay Camila - logo vamos falar mais sobre esse nome -, chegaram no país de Maradona.

Os três milagres

Qual das situações você aponta como mais favorável: ganhar de 1 a 0 ou 4 a 1? Ambos são resultados triunfantes mas, quando você está dependendo de uma combinação de resultados, quanto mais você conseguir fazer, melhor. E esse foi o primeiro milagre da Ferroviária. Quem diria que ainda haveriam outros dois...

Ainda na fase de grupos, Locomotiva e Libertad-Limpeño, do Paraguai, ficaram lado a lado na extensa corrida rumo às quartas de final. Na última e determinante rodada, as paulistas golearam o Universidad do Chile, por 4 a 1, enquanto seu principal concorrente apenas empatou. A Ferroviária havia cruzado a linha de chegada do saldo de gols. Mas ainda faltava muito.

Nas quartas de final não se fez necessário nenhum milagre - talvez alguns guarda-chuvas, claro. Diante do que parecia uma tempestade, as Guerreiras Grenás venceram o River Plate, por 1 a 0. O segundo milagre ainda estava por vir: em plena semifinal, o caminho do time de Araraquara cruzou novamente com o da Universidad do Chile.

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Locomotiva eliminou o River Plate / Gustavo Pagano/GettyImages

Na guerra quase romana entre brasileiras e chilenas, o duelo foi realmente digno de uma semifinal. Apesar do placar zerado no tempo regulamentar, não faltou raça e entrega. La U, aliás, teve inclusive a chance de converter um pênalti, mas a bola foi lançada tão distante da meta paulista que até os mais céticos sabiam que a partida seria decidida nos pênaltis.

E esse foi o segundo milagre: Luciana. A goleira salvou três pênaltis, sendo dois deles em cobranças alternadas. Ou seja, em duas ocasiões, quando tudo dependia apenas das jogadores de La U, a arqueira se multiplicou. A Ferroviária era novamente finalista. Do outro lado, estava o time que bateu o poderoso Corinthians: América de Cali, da Colômbia.

Libertadores Feminina Ferroviária América
América e Guerreiras Grenás em ação pela Libertadores / AGUSTIN MARCARIAN/GettyImages

O Estádio José Amalfitani, em Buenos Aires, foi palco do terceiro milagre. No dia 21 de março de 2021, a Locomotiva chegou ao topo da América do Sul mais uma vez. Com gols de Patricia Sochor e Aline Milene ainda na primeira parcial, as paulistas construíram o placar de 2 a 1 - Catalina Usme, uma das referências do futebol feminino sul-americano, descontou para as colombianas também no primeiro tempo.

O outro "pequeno milagre" talvez tenha sido justamente segurar o América nos 45 minutos finais. Partindo literalmente para o tudo ou nada, as comandadas do treinador Andrés Usme deixaram 100% de si em campo, quatro bolas da trave de Luciana, uma ofensividade digna de aplausos e, por fim, a decepção do segundo lugar.

As Guerreiras Grenás estavam protegidas pela força divina do propósito. E o título da Libertadores Feminina não poderia estar em mãos melhores. Lindsay Camila, primeira mulher a comandar um time campeão do torneio continental, bradou: "Todas as mulheres têm que acreditar que conseguem. As mulheres precisam de mais espaços em todos os lados".

Lindsay Camila Libertadores Ferroviária
Lindsay Camila escreveu seu nome na história do torneio continental / AGUSTIN MARCARIAN/GettyImages

A Ferroviária estreia na Libertadores Feminina 2021 nesta quarta-feira (3). O primeiro adversário será o Club Sol de América, do Paraguai.