Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência: a importância da acessibilidade nos estádios de futebol
- No dia 21 de setembro, celebramos o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência
- De acordo com o IBGE, 8,9% da população brasileira (de 2 anos de idade ou mais) possui alguma deficiência
Por Nathália Almeida
Considerado como a maior das paixões nacionais, o futebol é uma ferramenta de transformação social capaz de arrastar multidões, aproximar desconhecidos e quebrar barreiras entre os diferentes. Contudo, apesar de suas bases populares e deu potencial de unidade, infelizmente não podemos dizer, de forma geral, que o futebol em nosso país é para todos, sem distinções: uma significativa parcela da população brasileira ainda esbarra em grandes dificuldades estruturais para poder acompanhar de perto seu clube do coração.
Para marcar este 21 de setembro, data em que celebramos o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, o 90min traz uma reflexão importante acerca da realidade vivida por este grupo social heterogêneo ao qual, infelizmente, inúmeros direitos ainda são negados em sua plenitude – o direito à cidade e cidadania, o direito à autonomia e ao emprego, e também o direito de torcer.
Brasil: indicadores e desafios
Lançada em meados de 2023, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD): Pessoas com Deficiência 2022, estudo elaborado através de uma parceria entre a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNDPD) e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mapeou indicativos e indicadores atualizados envolvendo a população com deficiência no Brasil.
Ao todo, são 16,8 milhões de pessoas (de 2 anos de idade ou mais) com deficiência em nosso país atualmente, o que representa 8,9% da população dessa faixa etária em solo brasileiro. Para além do mapeamento de números gerais, o estudo também destrinchou as desigualdades socioeconômicas existentes entre pessoas sem e com deficiência – um dos indicadores mais preocupantes é a taxa de analfabetismo quase 5x maior entre PCD's.
Indicador social | Pessoas com deficiência | Pessoas sem deficiência |
---|---|---|
Taxa de analfabetismo | 19,5% | 4,1% |
Nível Superior Completo | 7,0% | 20,9% |
Espaço/inserção no mercado de trabalho | 26,6% | 60,7% |
Rendimento médio (real) | R$ 1.860 | R$ 2.690 |
Outro indicador preocupante acerca da realidade de pessoas com deficiência no Brasil é o alta taxa (55%) de pessoas deste grupo social trabalhando em situação de informalidade, ou seja, sem acesso à ampla maioria dos direitos trabalhistas como carteira assinada.
Como falamos nos parágrafos iniciais deste artigo, nosso país ainda caminho a passos lentos quando o assunto é a garantia de direitos básicos, em sua plenitude, para pessoas com deficiência. Apesar da Constituição Federal de 1988 prever, em seu artigo 5º, que "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade", a aplicação do princípio constitucional da igualdade em solo brasileiro ainda é falha.
Pelo Direito de torcer, sem Capacitismo
Onde entra o "torcer" dentre os direitos básicos que devem ser defendidos e assegurados para todos? Se engana quem pensa que lazer e acesso ao esporte são triviais ou secundários quando falamos de pessoas com deficiência. Não há inclusão social ou igualdade de oportunidades em sua plenitude sem o debate sobre acessibilidade em todos os espaços públicos, das escolas aos hospitais, passando também, é claro, pelo estádio de futebol.
O artigo 44 da Lei de Inclusão a Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) dispõe sobre a reserva de espaços e assentos para pessoas com deficiência nos estádios, algo que podemos, em linhas gerais, considerar como uma realidade no Brasil. Entretanto, de que adianta assegurar, na "frieza da lei", um espaço na arquibancada para este grupo social se todo o entorno não fornece as condições ideais para que estas pessoas estejam lá? O artigo 44, portanto, não pode ser aplicado sem diálogo direto com os artigos 45 e 46, que defendem a boa visibilidade nestes espaços, sua localização sempre sinalizada e próxima aos corredores e a acessibilidade arquitetônica, que permita o livre acesso e circulação destas pessoas.
"Tem a sinalização dos cadeirantes, e ao lado tem as cadeiras para os acompanhantes. É importante que respeitem as vagas. Muitas vezes fico numa vaga e a outra, que é de cadeirante, fica gente em pé e atrapalha nossa visão. Já aconteceu de eu levar banho de cerveja, de gente – que não deveria estar naquele espaço – vibrar com o gol e bater sem querer em mim"
- Daniel Melo, ao Diário do Nordeste
Rampas fechadas, falta de elevadores ou escadas rolantes funcionais, banheiros não adaptados e a falta de treinamento adequado para profissionais que atuam nos estádios são alguns dos diversos obstáculos reais enfrentados por pessoas com deficiência em seu acesso ao direito de torcer. A transformação desta dura realidade, que não deve ser de forma alguma "romantizada" com discursos vazios de heroísmo e superação, passa por políticas públicas eficientes e pela conscientização da sociedade em geral.
Pessoas com Deficiência como agentes da mudança: coletivos e torcidas
Ao mesmo tempo em que militam por melhorias estruturais através de políticas públicas eficazes, pessoas com deficiência seguem disputando espaços e sendo agentes de transformação em prol de uma arquibancada mais inclusiva no futebol brasileiro. Temos acompanhado, nos últimos anos, o crescimento expressivo do número de coletivos e torcidas PCD em nosso país, como a Autistas Alvinegros (Corinthians) e a Cadeirantes de Aço (Fortaleza), fundada em 2022.
"A Cadeirantes é também um movimento social que quer garantir o direito das pessoas com deficiência, sejam elas com deficiência física, visual, auditiva, intelectual. Todas têm o mesmo direito. E é isso que os governos devem fazer: trabalhar com políticas públicas para que a gente tenha um lazer digno."
- Daniel Melo, ao Diário do Nordeste
Fundamentais para a construção de um sentimento de segurança e principalmente pertencimento, estes coletivos e torcidas são exemplos positivos de iniciativas independentes que colaboram para um futebol mais plural e diverso. Mas esta caminhada não pode e não deve ser "solitária": amplificar e se somar à luta, ser um aliado e reivindicar junto ao governo a garantia dos direitos das pessoas com deficiência é missão de toda a sociedade civil. Vamos juntos?