Em carta ao The Players' Tribune, Rüdiger expõe a dura realidade do racismo e exalta 'tato' de De Rossi
Por Antonio Mota
Não se trata de uma curta conversa ou de uma legenda no Instagram, mas, sim, da vida de Antonio Rüdiger. “Você quer ouvir minha história? Você realmente quer entender?”, questionou o zagueiro do Chelsea e da Seleção da Alemanha em carta ao The Players' Tribune. Finalista da Champions League 2020/21, o defensor de 28 anos nunca teve uma vida fácil e desde novo percebeu que precisaria lutar contra o racismo e contra a ignorância para conseguir realizar os seus sonhos. Ao TPT, o menino de Berlin-Neukölln falou tudo. Confira.
Revelado pelo Stuttgart, da Alemanha, e com passagem pela Roma, da Itália, Rüdiger atuou profissionalmente em apenas três clubes ao longo de sua carreira, incluindo o Chelsea – time atual. E, nessas equipes, ele colecionou muitas histórias, sendo umas boas e outras bem ruins, como uma que aconteceu em sua estada no Olímpico. À época, em um Derby della Capitale, o defensor encarou o pior e mais raivoso momento racista de sua vida.
“Eles gritavam: ‘Vá se f*der, vá comer uma banana’. Cada vez que eu tocava na bola, eles faziam grunhidos de macaco. Não foram apenas algumas pessoas. Foi uma grande parte dos torcedores da Lazio durante o Derby della Capitale, em 2017. Esse não foi o primeiro ato racista que sofri, mas, certamente, o pior. Foi ódio real. Você sabe disso quando vê nos olhos deles. No momento, não reagi. Eu não saí do campo. Não queria dar a eles esse tipo de poder”.
"Mas, por dentro, não importa o quão forte seja, se você é um ser humano com um coração batendo, ficará marcado por isso", acrescentou Rüdiger.
"Sempre que algo assim acontece, como o mundo do futebol reage? Há uma investigação, mas nada acontece. De vez em quando, temos uma grande campanha nas redes sociais, todo mundo se sente bem consigo mesmo e, então, voltamos ao normal."
- completou o zagueiro.
Neste caso específico do Derby della Capitale, Rüdiger contou uma história com Daniele De Rossi e enfatizou que se importar é muito mais importante do que postar. “Toni, sei que nunca vou sentir o mesmo que você. Mas me deixe tentar entender sua dor. O que está passando dentro da sua cabeça?”, falou o lendário defensor da Roma para ele, em um tom de preocupação e de busca por entender aquela situação.
Ressurgindo no Chelsea após a chegada de Thomas Tuchel, Rüdiger revelou conversa que teve com o treinador pouco tempo após o comandante chegar à Stamford Bridge. “Ele disse: ‘Toni, deixa eu te perguntar uma coisa. Eu te observo e vejo que você é muito intenso em campo. Você joga com tanta emoção... De onde vem isso?’. E eu contei pra ele a minha história”, falou o zagueiro, que no final de semana vai disputar a final da Champions League sob comando do treinador.
“E veja como a história pode mudar rapidamente. Quatro meses atrás, as redes sociais diziam que eu não valia nada. Kai Havertz não era bom o suficiente. Timo Werner não era bom o suficiente. Pouco importa que Kai e Timo tenham se mudado para um novo país no meio de uma pandemia. Pouco importa que sejamos seres humanos, não robôs. Nada importa. Todos nós éramos inúteis. Agora aqui estamos quatro meses depois, em uma final da Champions League”.
"Se você entrar em suas menções na mídia social, verá um lado muito sombrio da humanidade. Você vai entender que ainda temos um caminho longo, muito longo, a percorrer como sociedade."
- disse Rüdiger.
Em sua carta ao The Players' Tribune, Antonio Rüdiger citou vários outros casos de racismo, falou das campanhas 'vazias' nas redes sociais e até criticou os jogadores por não levarem um assunto tão importante mais a sério.
“Nós, jogadores de futebol, fazemos parte desse sistema. Quantas vezes temos esse tipo de conversa profunda no vestiário? Não com tanta frequência, para ser honesto. Parece que estamos realmente muito alienados para falar sobre essas coisas da vida real. É sempre PlayStation, Instagram, carros, a próxima partida – sempre há algo para nos alienar de assuntos mais difíceis”, questionou o defensor, antes de encerrar:
“Eduque-se. Leia um livro sobre a história do povo preto e, de fato, abra sua mente para as vivências de outras pessoas. Isso é muito mais significativo do que enviar um tuíte. É aqui que podemos começar. Eu não sou ingênuo. Não espero que tudo mude da noite para o dia. Não espero que a comunidade do futebol se reúna para acabar com o racismo em 48 horas, como acabou com a Superliga... Já vivi demais para ter a esperança de um menino”.
“Mas eu não estou desiludido. Vou continuar lutando – para sempre. Porque eu sei que existem pessoas lá fora que se importam. Eu sei que existem pessoas que realmente me ouvem".
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