EXCLUSIVO: Amoroso abre o coração e relembra feitos do São Paulo, mas destaca ao menos duas frustrações da carreira
Por Fabio Utz
Revelado pelo Guarani, Amoroso foi um dos grandes atacantes do futebol brasileiro na última década do século XX e na primeira década do século XXI. Não à toa defendeu equipes gigantes do país, como Flamengo, São Paulo, Corinthians e Grêmio, e ainda fez carreira no exterior, atuando em clubes como Borussia Dortmund, da Alemanha, e Milan, da Itália. Em conversa com o 90min, o agora ex-jogador lembrou de situações marcantes de sua trajetória, com destaque, claro, para o momento mágico vivido no Morumbi, com as conquistas da Libertadores da América e do Mundial de 2005. No entanto, não deixou de destacar também sua ligação com o Bugre e a frustração de não ter dado certo em Porto Alegre.
Como é que foi pra você, com 18 anos, ir para uma cultura completamente diferente, sozinho, no Japão?
O Japão, pra mim, foi o grande divisor de águas na minha carreira. Principalmente porque eu sou muito grato ao povo japonês. Tudo aquilo que eles me deram, toda aquela cultura que eu aprendi e vivenciei por dois anos no futebol japonês. Eu só não me naturalizei japonês porque eu pertencia ao Guarani. Meu passe era do Guarani e eu tive que voltar ao futebol brasileiro. Aí eu acabei me destacando e depois não teve jeito, a minha carreira tomou outro rumo.
E aí acabou indo para o Flamengo e ficou só três meses. Como é que foi isso, cara?
No Flamengo eu fui emprestado após a minha recuperação. Fiquei só o Campeonato Carioca, porque meu passe ainda pertencia ao Guarani. Aí eu fiquei no Campeonato Carioca, fui campeão e acabei sendo vendido para a Udinese. E aí vou para a Itália em julho de 96, apresentado pelo Zico. Foi maravilhoso poder ter tido a oportunidade de ser apresentado na Itália pelo meu ídolo.
Você foi pro Málaga, uma passagem até breve pelo Málaga...
Um ano.
Um aninho...e aí você tinha uma proposta do Alavés na mão e resolveu ir pro São Paulo. Você nunca tinha jogado uma Libertadores e você já entra numa semifinal contra River Plate, revendo seu companheiro de Guarani, de ataque, o Luizão e, em tão pouco tempo, em seis meses de clube você se tornou ídolo. Como é que foi, como foi essa chegada, como é que foi essa passagem?
Bom, assim, eu estava com contrato com o Málaga de um ano com opção de mais dois. E aí acabei que não renovei porque tinha proposta do Alavés e do Celta de Vigo. Eu tinha voltado pro Brasil e estava estudando essa situação de permanecer no futebol europeu e aí acabou surgindo essa situação no São Paulo, no momento do Grafite, de contusão, que precisavam de um centroavante pra poder dar sequência naquela grande campanha que o São Paulo já vinha fazendo. Inclusive o Grafite era um dos grandes destaques daquele elenco. Aí acabou pintando meu nome pela parceria com o Luizão desde a base do Guarani.
Você foi apresentado no dia 18. E você jogou no dia 22 (semifinal da Libertadores, contra o River Plate)! Na história do futebol recente, eu não lembro de alguém que tenha sido contratado tão pouco tempo antes, que tenha sido apresentado tão pouco tempo antes de jogar. E não é que você chegou e jogou de qualquer jeito. Enfim, eu tô deixando passar...
Só faltou chover, né? Só faltou chover, velho...Faltou meu golzinho. Eu falo pra todo mundo que aquele jogo ali, minha estreia contra o River...faltou meu gol, mas foi acho que um dos grandes jogos que eu fiz em toda a minha carreira. Porque parecia que eu já estava no São Paulo há vinte anos.
Você já chegou com liderança...
É, e eu ainda falei assim pros caras: 'se tiver difícil, joga em mim. Joga aqui que eu resolvo, velho. Não fica com medo não, pode jogar aqui'. Aí os caras já deram aquela acalmada. Falaram 'pô, o cara chegar com essa personalidade assim, já ajuda, né'.
Mas você estava com essa confiança toda mesmo ou você falava mais pra...
Não, assim, é que nem eu falo pra você. Depois de muitos anos de estrada no futebol europeu, é fácil você mapear um jogo. Entender a parte tática de um jogo que você pode ser importante, porque é um campeonato diferente de um campeonato nacional que você está acostumado a disputar. Mesmo você jogando num futebol como eu jogava na Itália, joguei na Alemanha, na Espanha. Você voltando pra disputar uma Libertadores, você consegue ter mais tranquilidade para poder entender a importância daquele jogo.
Libertadores é diferente?
Libertadores é um campeonato à parte no mundo. Eu acho que quem nunca jogou precisa ter essa experiência. Porque jogar na Europa é fácil, né. Tudo certinho, tudo bonitinho. Agora vai jogar e tomar cusparada, pedrada, tijolada. Cara, isso aí que é bom demais, velho. Só sobrevive quem é forte, só os caras mesmo.
Você nunca tinha jogado uma Libertadores, chega numa semi comendo a bola, ganha do River, campeão com um 4 a 0 na final, como é que era o espírito daquele grupo indo pro Japão? Vocês achavam mesmo que vocês iam ser campeões?
Bom, ali tinha duas opções: ou você se transforma num protagonista do filme ou você ia ser o vilão. Ou você vai pra ganhar ou você volta como um motivo de chacota porque foi e perdeu. Então não adiantaria você praticamente fazer um ano inteiro de sacrifício ganhando a Libertadores pra chegar lá e não trazer um título importante que era o Mundial de Clubes. E realmente a gente sabia que não ia ser fácil ganhar, Era a chance da vida de cada um.
Você falou de jogo da vida, e aí você recebe uma proposta do Milan, que é um dos maiores clubes do mundo inteiro. Eu entendo, eu também não recusaria.
Mas eu fiquei frustrado como jogador que não me ofereceram uma renovação de contrato.
É mesmo? Então você não ficou no São Paulo porque não te ofereceram? Se tivessem te oferecido, você teria ficado? Ou não?
Com certeza. Logo depois da Libertadores, eu pedi pro São Paulo: ‘renova o meu contrato'. Eu não precisaria mais sair do Brasil, eu já tinha jogado fora. Eu falei: 'renova meu contrato, quero contrato de três anos para poder encerrar minha carreira aqui no São Paulo, ficar aqui e não sair mais'. Enrolaram, enrolaram e enrolaram. E eu fiquei aguardando, o São Paulo não manifestou interesse. Depois de muitos anos eu entendi o porquê. E aí eu não podia ficar, né, como qualquer profissional tem que arrumar outro emprego, um outro trabalho. E aí surgiu a possibilidade de ir para o Milan e eu não poderia recusar um clube desse tamanho.
Aí você volta para o Brasil, volta para o Corinthians. Como é que é para você chegar em um clube rival?
Naquele momento da ida do Corinthians foi porque o (Emerson) Leão (Técnico), com quem eu já tinha uma grande amizade desde a época do Guarani, me ligou querendo que eu ajudasse ele a tirar o Corinthians da fase difícil que estava, que era do rebaixamento. E aí ele me ligou e falou: 'preciso da sua ajuda'. Eu não posso falar 'não' pro Leão, porque ele é um cara extremamente profissional, o cara que formou aquele time do São Paulo campeão da Libertadores. Tanto que a minha esposa falou 'você é louco, você vai voltar pro Corinthians, olha lá a tabela, penúltimo!'. Falei 'fica tranquila, sou profissional, nós vamos jogar, vamos ajeitar. Fazer história? Não sei. Mas cair comigo lá não vai’.
Como é que foi a sua passagem pelo Grêmio? O que você acha da torcida do Grêmio, uma torcida que também tem uma pegada meio castelhana. A Geral Do Grêmio...
Cara, o Grêmio é espetacular. Grêmio...que torcida. Que clube. que cidade. Porto Alegre foi pouco tempo, né, porque infelizmente o treinador que eu peguei lá, o Mano Menezes, não me deu as oportunidades que eu merecia para eu poder mostrar pro torcedor gremista que eu era importante para aquele time. No momento em que eu estava começando a ter a minha sequência de jogos, eu tive uma expulsão contra o Defensor, do Uruguai, e acabei pegando três jogos (de suspensão) na Libertadores e fiquei fora das duas semifinais e do primeiro jogo da final contra o Boca Juniors. E depois daquela decisão eu acabei tendo uma contusão também contra o Internacional num Gre-Nal, no qual eu comecei de titular. E dali a minha história...voltei, recuperei, mas não tive uma sequência como achava que poderia ter. Foi, pessoalmente uma frustração não poder ter dado certo como eu achava que poderia ter dado certo. Pela torcida que tem, pela instituição que é, mas infelizmente o treinador não era pra mim o correto na época. Em vez de me ajudar, infelizmente só me prejudicou.
Por que encerrar a carreira no Guarani?
Porque ele está na minha pele. Foi o time que me lançou para o mundo, onde eu comecei com 15 anos. A gente tem que ser grato por ser prata da casa de um clube. Você tem que levar pro resto da sua vida a oportunidade que esse clube te deu para que você pudesse chegar aonde chegou. Você tem que ser grato para a instituição que te deu o pão com manteiga, o almoço, a janta, te formou como atleta, te disse o que é certo e o que é errado. Merece retornar à elite como dos grandes clubes do futebol brasileiro. Único campeão brasileiro do interior do Brasil. Vai ser difícil qualquer outro clube conseguir esse feito, porque além de ser um clube tradicional, é um clube que revelou muitos jogadores inclusive com passagem por São Paulo, por Corinthians, que dali foram campeões mundiais, campeões de tudo. O Guarani é referência para qualquer clube no Brasil em termos de formação.
E qual é o seu recado para os seus fãs espalhados pelo mundo inteiro?
Gratidão pelo carinho que eles têm por mim. Com certeza a recíproca é verdadeira, porque se não fosse por eles a gente não teria história. São os fãs, os torcedores que fazem você poder um dia ser idolatrado.