Exclusivo! Renato Portaluppi em Roma: como foi e o que ficou da passagem do atacante pelo time da capital italiana

Lucas Uebel/Getty Images
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Ser idolatrado em dois grandes clubes do futebol brasileiro não é para qualquer um. Pois aos 25 anos, quando acabou contratado como uma verdadeira estrela pela Roma, da Itália, Renato Portaluppi (ou Gaúcho) já carregava consigo esse status.

Campeão da Libertadores e do Mundial pelo Grêmio em 1983 (afora outros títulos) e ganhador do Campeonato Brasileiro (1987) pelo Flamengo, desembarcou em uma das mais importantes capitais da Europa com a responsabilidade de, mais uma vez, marcar época. A fama, inclusive, lhe deu a chance de chegar de helicóptero ao Centro de Treinamento de Trigoria para ser apresentado. Seu vínculo teve início exatamente há 22 anos, em 1º de julho de 1988, só que nem de longe ele repetiu os feitos obtidos com seus ex-times. Pelo contrário. Até iniciou bem, com três gols em cinco partidas na Coppa Italia e uma bola na rede diante do Nuremberg, pela Copa da Uefa, duelo este que ganhou praticamente sozinho. Só que a esperança dos romanistas em ver em campo um novo Falcão ou um novo Toninho Cerezo se dissipou logo, com Renato disputando 23 compromissos pela Serie A e não comparecendo no placar uma vez sequer.

A euforia, claro, deu lugar à decepção, e a passagem do atacante pelo clube durou apenas uma temporada. Na metade de 1989, o gaúcho retornou para a Gávea. A pergunta é: o que explica isso? Para tentar respondê-la, o 90min conversou com o jornalista Piero Torri, que cobria a Roma à época. Aproveitamos para falar com alguns fãs do clube com o intuito de também ouvir a percepção de quem torceu, e muito, para que o atacante brilhasse. Ao final, através de um relato do repórter Cícero Mello, da ESPN Brasil, você também ficará sabendo como ele noticiou, com exclusividade, a ida do astro para a Europa.

O CONTEXTO DA CHEGADA E O RESULTADO FINAL

A Roma, ao contratar Renato (e Andrade, que veio junto do Flamengo), tinha um objetivo claro: voltar a ser o grande time do início da década de 1980, quando conquistou um Scudetto na temporada 1982-1983. Baseada na tradição de obter feitos importantes com brasileiros em seu plantel (algo que seguiu com Cafu, Aldair, Emerson, Antonio Carlos), apostou em alguém vitorioso, capaz de “quebrar tudo”.

Juliana Flister/Getty Images

A ideia era que, com o atacante, a equipe pudesse alimentar (e se dar bem, claro) a rivalidade com a Juventus. E a expectativa, claro, foi lá no alto. “Estávamos todos convencidos de que a Roma havia comprado um fenômeno, mas acabou sendo um fracasso. Ficou claro que ele recebeu todos os louros de um campeão, mas não conseguiu deixar sua marca aqui”, diz Pietro, um fanático romanista. “Todos sabemos como é a Roma. Chegar de helicóptero é uma grande responsabilidade. Um grande campeão era esperado por todos”, destaca David, outro torcedor.

"Estou feliz por ter entendido em sua terra a lenda que você é. Desejo tudo de bom para o futuro, quem sabe no banco da seleção!"

Marco, torcedor da Roma (mora no Brasil)

Torri, por tudo o que foi possível acompanhar, confirma a impressão dos torcedores e vai além, fazendo uma análise de fatores que levaram a esta derrocada. “Ele não conseguiu se estabelecer porque chegou à Itália com a atitude e a maneira de jogar de um jogador de futebol brasileiro, pensando que o futebol era, antes de tudo, uma diversão. Veio de um futebol com diferentes tempos de jogo. No Brasil, havia espaço para parar a bola, girar e seguir. Na Itália o futebol é muito mais físico e, na época, era ainda mais difícil para ele. Devemos acrescentar que a Roma estava declinando lentamente e não era mais a equipe do início dos anos 80. Na minha opinião, ele também pagou pelo fato de ter chegado com Andrade, que foi outra grande decepção. (Nils) Liedholm (técnico) nos disse que ele era um jogador técnico melhor que Maradona, mas infelizmente ainda jogava parado, e o futebol, especialmente na Itália, tinha ritmos muito fortes. Renato e Andrade foram, portanto, identificados como os principais culpados daquela Roma decepcionante.”

A RELAÇÃO COM OS COMPANHEIROS E A VIDA EXTRACAMPO

Sempre que falou a respeito de sua passagem pela Roma, Renato destacou que foi boicotado por companheiros. Pois Torri confirma que o relacionamento não era dos melhores. “Ele certamente teve problemas com Massaro, acho que houve até um episódio em que eles chegaram às vias de fato no vestiário. Não posso dizer o mesmo com relação a Giannini, mas acho que a relação também não era amigável”, afirma o jornalista. A informação chegou à torcida. “Acho que ele teve problemas com Giannini, e isso repercutiu em campo. Giannini tinha um caráter particular, então o fato de ele ser romano e romanista o tornava intocável tanto para os fãs quanto para o clube. Sem dúvida, esse foi um dos fatores que gerou um desempenho aquém das expectativas”, completa David.

"Gostaria de ver o verdadeiro Renato e seria bom voltar a ser mais jovem e talvez lhe dar outra chance!"

Pietro, torcedor da Roma

Há quem diga, porém, que Renato era cobrado pelos colegas por seu comportamento fora das quatro linhas. A fama de playboy e mulherengo, sim, custou caro. “Até onde eu sei, ele amava muito as mulheres, e o status de jogador da Roma o ajudou muito. Na Itália, os jogadores são superestrelas, e muitas mulheres saem para procurá-los. Digamos que, quando encontraram Renato, foi o ápice”, destaca Marco, também torcedor que respondeu os questionamentos do portal. Pietro, por sua vez, até faz um trocadilho com esta situação. “Se no campo ele lutava, na discoteca e com as mulheres ele era sem dúvida um campeão”, brinca.

A PRESSÃO, A DECEPÇÃO E A REALIDADE ATUAL

Os torcedores romanistas sabem que Renato Portaluppi não foi o único estrangeiro a decepcionar com a camisa do clube e dizem que o ambiente da cidade e a pressão oriunda das arquibancadas e também do ambiente interno, por vezes, acabam prejudicando. Até mesmo a mídia está muito em cima, com fortes cobranças.

Matthew Ashton - AMA/Getty Images

Por isso, na opinião de quem buscava um ídolo e acabou vendo ‘apenas’ mais um atleta passar pela equipe, fica uma lição. “Se um jogador chega em Roma oriundo do Brasil, aclamado como um fenômeno e não faz nada, não acho que pode ser apenas culpa dele. Teve suas responsabilidades, mas não pode ter sido o único a cometer erros. Se vermos mais adiante, quantos jogadores que se saíram bem em outros lugares de Roma tiveram dificuldades?”, questiona Marco. Pietro vai pelo mesmo caminho. “Se ele se comportou assim é porque sabia que nada iria acontecer. Eu não acho que se ele fosse para outro lugar onde talvez houvesse outro tipo de empresa, ele teria feito o mesmo. Em Roma, com rádios noticiando tudo a todo momento, se não houver problema, certamente vão criar.”

"Esperávamos muito, mas não temos muito o que fazer. Deu errado. Mas ao menos você conseguiu se divertir aqui em Roma! "

David, torcedor da Roma

Mesmo com este atenuante, o desapontamento foi geral. “Foi sem dúvida uma das maiores decepções do futebol italiano. Como eu disse antes, houve uma espera incrível, e a realidade era totalmente oposta. Havia a crença em Roma de que outro Falcão estava chegando, com uma capacidade de mudar por completo a equipe. Era uma estrela”, confirma Torri.

Surpresa ou não, o brasileiro voltou a se destacar quando retomou a prática do futebol em terras tupiniquins. Botafogo, Cruzeiro e Fluminense foram clubes que puderam usufruir de seu talento. Hoje, como treinador do Tricolor gaúcho, trilha também o caminho das vitórias (são seis troféus desde 2016, sendo a Copa do Brasil e a Libertadores os mais importantes), tendo até sido cotado para a seleção brasileira. Agora, não dá para esquecer que o ego continua lá em cima. Ou você pensa que as declarações dele, dizendo que foi melhor que Cristiano Ronaldo, não chegaram até a Europa? “Ouvimos essa notícias, e a comparação só nos faz rir”, conclui o jornalista.

A NOTÍCIA QUE CAIU COMO UMA BOMBA NO FUTEBOL BRASILEIRO

Foi o repórter Cícero Mello, hoje na ESPN e à época na Rádio Nacional, do Rio de Janeiro, que descobriu que Renato estava sendo negociado para a Roma. Em um domingo de Fla-Flu, do qual o atacante não participaria, pediu para ficar de fora da transmissão para ir atrás da informação. E conseguiu.

Ele sabia que haveria um almoço para tratar da venda e, para não perder qualquer detalhe, se posicionou próximo ao edifício onde morava o atleta, junto ao túnel Rebouças. Tentou tirar uma informação de Alcindo, ex-atacante, que apareceu ali. Veio apenas uma dica. “Fica esperto que eles já vão sair para almoçar e tem uma porção de gringos aí.”

Não demorou muito para o carro de Renato sair, com o jogador no banco do passageiro e Raquete, seu antigo companheiro e assessor, na direção. Atrás, veio um outro veículo cheio de pessoas “com terno e gravata”. Mello os seguiu com seu carro e, depois de quase ficar para trás em um sinal próximo à sede do Flamengo, conseguiu se manter na cola até chegar a um hotel localizado na avenida Vieira Souto, em Ipanema. Até então, ninguém havia notado a sua presença. Deixou passar um tempo e subiu ao restaurante, onde sentou em frente à mesa em que ocorria a refeição e, claro, a negociação. Quando Renato o viu, veio a cobrança: “O que você está fazendo aqui?”, perguntou. “Não interessa o que estou fazendo, interessa é que estou aqui. Vim aqui apurar essa notícia que eu recebi”, rebateu o profissional.

Após uma breve conversa e a tentativa de Renato em saber quem havia passado a informação ao repórter, ele prometeu que daria uma entrevista exclusiva. Cícero, então, entrou no ar com a informação (faltavam cerca de duas horas para o clássico) e, mais adiante, colocou o camisa 7 na linha perguntando, de cara, para onde ele estava indo. “Cícero, eu vou dizer uma coisa. Você é chato para caramba, mas tenho que reconhecer que é um ótimo repórter. Como prometi, vou dizer aqui com exclusividade. Acabei de ser negociado com a Roma, da Itália. Estou indo segunda-feira para fazer os exames médicos. E como você estava em cima do lance, vou te dar uma outra notícia. O Andrade foi negociado também e está indo junto comigo.” E assim foi.

OBS: O 90min entrou em contato com a assessoria de imprensa do técnico Renato Portaluppi solicitando uma entrevista a respeito do tema. O treinador, que se encontra no Rio de Janeiro por conta da pandemia de coronavírus, retornou dizendo que todos os pedidos, na medida do possível, serão atendidos quando da volta a Porto Alegre. Tão logo seja viável esta entrevista, a faremos.