No mês do orgulho, Richarlyson protagoniza o maior ato de valentia que o futebol brasileiro já viu
Por Lucas Humberto
"Todo dia eu tinha que mostrar algo diferente, e isso sempre falei. Um erro meu era peso cinco. (As pessoas) me atacavam mesmo, parecia uma matilha de lobos."
- Richarlyson em podcast da Globo
Às vésperas da celebração do Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, 28 de junho, ouvir Richarlyson é um alento. Ao podcast Nos Armários dos Vestiários, o ex-volante declarou ser bissexual.
"Pelo tanto de pessoas que falam que é importante meu posicionamento, hoje eu resolvi falar: sou bissexual. Se era isso que faltava, ok. Pronto. Agora eu quero ver se realmente vai melhorar, porque é esse o meu questionamento", bradou.
Em primeiro plano, chama atenção o pioneirismo. Richarlyson tornou-se o primeiro atleta da Série A a se declarar LGBTQIA+. Isso em quase duas décadas contabilizando apenas a era dos pontos corridos. E quem poderia culpá-lo - e tantos outros que sofrem neste momento - pelo silêncio?
Ao longo da sua vitoriosa carreira - digna de três Brasileiros consecutivos, duas Libertadores e um Mundial -, Rick sofreu violentas tentativas de ser retirado do armário. Você pode-se pergunta hoje: a troco de quê? Talvez de, enfim, legitimar o preconceito.
"Muita gente maldosa vai falar isso, que eu falei agora porque não jogo mais. Não. Eu nunca falei porque não era a minha prioridade, como não era hoje, mas hoje eu me senti à vontade de falar. Eu queria que não existisse essa pauta. Eu queria estar falando aqui da minha nova carreira (comentarista). Mas é importante", destacou durante a entrevista.
Em um determinado ponto da história, tomaram a paradoxal atitude de se assumir por Richarlyson. A voz do ex-volante pouco importava. Qualquer negativa vinda dele era tida como mentira. Em nome da heteronormatividade, decidiram que Rick não poderia ser parte integrante do viril, másculo e valente futebol. Ele não deu ouvidos.
E, agora, as violentas tentativas de tirá-lo do armário pareciam querer expulsá-lo do futebol. Mesmo talentoso e proativo dentro das quatro linhas, a torcida do São Paulo se recusava a entoar seu nome. Receberam Richarlyson com bombas no Brinco de Ouro quando o Guarani o anunciou. Qualquer outro campeão mundial seria recebido com tapete vermelho.
Curiosamente, o mesmo futebol alçou bad boys ao posto de heróis, celebrou agressores e por muito pouco não aceitou a volta de Robinho ao Santos, esse condenado em última instância por estupro. Há uma cartilha para decidir quem deve ser respeitado? É possível separar o autor da obra? Para Rick, houve apenas violência.
A Richarlyson nós devemos desculpas e agradecimentos na mesma medida. Alguns nascem com o direito de ser quem são. Outros precisam ousar para tê-lo. Rick pertence ao segundo grupo. E não há ato de valentia maior do que quebrar essa fronteira. "Você não é diferente. Você não tem que se sentir diferente, você tem que se sentir feliz", completou.