O Chelsea além do óbvio: o que você realmente precisa saber sobre o semifinalista do Mundial de Clubes

Do perfil do torcedor ao futebol feminino, o Chelsea vai muito além do que você vê dentro das quatro linhas
Do perfil do torcedor ao futebol feminino, o Chelsea vai muito além do que você vê dentro das quatro linhas / Visionhaus/GettyImages
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Um lançamento longo de Mason Mount deixou Kai Havertz em condições de tirar Ederson do caminho para estufar a rede. Era tudo que o Chelsea precisava: uma bola. E aquele lance selou a vitória dos Blues, por 1 a 0, diante do quase imparável Manchester City. Orgulho de Londres. A Europa tinha dono novamente. E o mundo? Pertence a quem?


É uma coisa do Chelsea: popularidade além do óbvio

Torcedores podem ser fiéis. Aliás, a maioria deles são. Quantos fãs você conhece que passam anos em jejum de títulos e, mesmo assim, não abandonam seus clubes do coração? A devoção vai além das taças. A importância dos troféus, no entanto, segue inalterável. Por eles times viram empresas, reforços milionários são contratados e preces são feitas.

Por isso, ninguém se espanta ao ver as equipes mais populares do momento ganhando adeptos. Faça uma caminhada no centro de qualquer capital brasileira, por exemplo, e você certamente encontrará dezenas de pessoas ostentando mantos de grandes instituições europeias. Paris Saint-Germain, Manchester City, Chelsea e, daqui alguns anos, talvez até do Newcastle.

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Blues conseguem captar diferentes gerações de torcedores / Ryan Pierse/GettyImages

Se o cinema não utiliza elementos por acaso, o jornalismo tampouco. Todos os clubes citados anteriormente passaram por diferentes processos de compra e, hoje, colhem frutos que o dinheiro pode comprar. Segundo um levantamento do instituto Roy Morgan Research, os Citizens, em 2004, representavam apenas a oitava maior torcida da Inglaterra.

Em 2021, precisos 17 anos depois da pesquisa apresentada, o portal Stadium Maps mediu a popularidade dos clubes da terra da rainha. E, desta vez, a equipe do Etihad Stadium apareceu na terceira colocação, com cerca de 40 milhões de fãs. A diferença é que o Chelsea, comprado por Roman Abramovich em 2003, tem a popularidade em seu DNA há pelo menos duas décadas.

Na pesquisa do instituto Roy Morgan, os Blues apareciam na quarta colocação. No estudo mais recente, o clube londrino aparece na vice-liderança, atrás somente do Manchester United, com aproximadamente 49 milhões de adeptos. As gerações mudam, mas parte da Inglaterra segue azul real.

Roman Abramovich Chelsea Mundial de Clubes Al-Hilal Palmeiras
Abramovich é proprietário do Chelsea / Alex Livesey - Danehouse/GettyImages

Jamie Spencer, jornalista do 90Min Football e nosso parceiro londrino, explica que a compra do clube teve papel fundamental na globalização de seus torcedores: "O que a aquisição de 2003 trouxe foi um grande orçamento e sucesso em campo, o que garantiu aumento exponencial do perfil do clube em todo o mundo", defendeu.

"O Chelsea tem uma base de fãs global muito maior por causa disso. Stamford Bridge também está localizada em uma parte afluente e turística de Londres, o que a torna uma atração para outras pessoas irem aos jogos. Isso afetou potencialmente a atmosfera no dia do jogo por ter esses 'torcedores turísticos', mas o clube se beneficiou de uma base de fãs maior", completou.

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Stamford Bridge está localizado na região central de Londres / Bryn Lennon/GettyImages

Orgulho de Londres: futebol feminino além do óbvio

Qualquer entendedor médio de futebol sabe reconhecer a magnitude da equipe masculina do Chelsea. Amado pelos apoiadores, temido pelos adversário. Encontrar quem conheça o tamanho da equipe feminina, por outro lado, não está entre as missões mais simples. Se antes na descontinuada FA Women's National League havia domínio do Arsenal, hoje ninguém está acima dos Blues.

Disputada pela primeira vez em 2011, a FA Women's National League (FA WSL), a elite dos torneios nacionais feminino da Inglaterra, começou com oito clubes envolvidos. Assim como acontece hoje com o Brasileirão Feminino, a profissionalização - e consequente popularização - não foi vista do dia para a noite.

Jessie Fleming Demi Stokes Chelsea Women Mundial de Clubes Palmeiras Al-Hilal
Chelsea Women está entre os clubes femininos de maior sucesso na Europa / Ryan Pierse/GettyImages

A liga tornou-se completamente profissional somente na temporada 2018/19, quando passou a ser obrigatório aos clubes oferecer um contrato formal às suas jogadoras. Embora possa pareça estranho manter funcionários sem a devida profissionalização durante tantos anos, as atletas do Corinthians, principal time feminino do Brasil, só passaram a ter registro em carteira em 2020.

"Não vejo razão para que os clubes não queiram apoiar o futebol feminino e oferecer a melhor condição possível para que tenham sucesso. Para mim, o futebol feminino tem um potencial enorme. Se elas recebessem incentivo no mesmo nível que o futebol masculino, o esporte obviamente teria o mesmo sucesso no lado empresarial. Acho que o investimento compensa"

Roman Abramovich à Forbes

Dado o devido contexto da modalidade, retornemos ao Chelsea. Engraçado como apenas uma contratação tem potencial de mudar a história de times inteiros, certo? Essa é Emma Hayes. Contratada em 2012, a treinadora só precisou de dois anos para levar os Blues ao vice-campeonato da WSL que, aliás, garantiu a inédita participação do clube na Champions League.

Emma Hayes Chelsea Mundial de Clubes Palmeiras Al-Hilal
Hayes é o símbolo do ambicioso projeto da equipe londrina / Ryan Pierse/GettyImages

Com os primeiros passos dados, era questão de tempo até que a consolidação fosse realidade. Recordista de taças da WSL, a equipe londrina levou quatro troféus do torneio: 2015, 2017/18, 2019/20 e 2020/21. Títulos da FA Cup são três: 2014/15, 2017/18 e 2020/21. Localmente, a dominância dos Blues se assemelhava ao Palácio de Buckingham: imponente e impiedosa.

"Emma Hayes tem sido a força motriz por trás disso [o sucesso da equipe] – o clube a ouviu e valeu a pena. O investimento contínuo sempre significará sucesso, mas é importante entender que Hayes é um grande fator para ser melhor que o Arsenal ou o Manchester City, que também desfrutam de grandes investimentos e apoio financeiro. O Chelsea é o melhor exemplo de atrair torcedores para o futebol feminino de forma consistente e está começando a lotar cada vez mais seu estádio para os maiores jogos."

Jamie Spencer ao 90min Brasil

Mas como até mesmo a London Eye precisa dos seus baixos, Hayes e suas comandadas não tiveram só vida fácil. Mesmo com a brilhante geração de Sam Kerr, Ann-Katrin Berger e Fran Kirby, a equipe azul real viu o título da Liga dos Campeões da temporada 2020/21 escapar entre os dedos. À época da grande decisão, no dia 16 de maio de 2021, o Barcelona de Alexia Putellas aplicou 4 a 0.

Contudo, provando que torcedores costumam ser fiéis, o revés pouco importou em meio ao tão frutífero ano dos Blues. Em junho de 2021, pouco mais de um mês depois da derrota na final da Champions, a instituição londrina anunciou que, pela primeira vez na história, todos os pacotes de ingressos disponíveis haviam sido vendidos.

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Torcida dos Blues aumenta exponencialmente / Alex Pantling/GettyImages

"Estou muito feliz em saber que vendemos mais ingressos para a temporada do que nunca. Sentimos uma tremenda falta dos nossos torcedores, mas sentimos o apoio deles ao longo da última temporada. Mal posso esperar para ver todos de volta a Kingsmeadow. Temos muito a celebrar"

Emma Hayes, treinadora do Chelsea

Cobham: categorias de base além do óbvio

Romelu Lukaku custou cerca de 115 milhões de euros (aproximadamente R$ 704 milhões) aos cofres do Chelsea. Mason Mount é o artilheiro da temporada. Reece James, por sua vez, o líder no âmbito das assistências. Com exceção do belga, ex-Inter de Milão, os dois ingleses foram formados no Centro de Treinamento de Cobham.

Mason Mount Chelsea Mundial de Clubes Palmeiras Al-Hilal
Mount mostrou talento ainda nas categorias inferiores / Ben Hoskins/GettyImages

Como quem não tem cão caça como gato, o potencializado uso da base nos últimos anos não aconteceu por acaso. Nunca acontece, diga-se de passagem. Em 2019, a Fifa puniu os Blues em razão da contratação irregular de 29 jogadores menores de idade estrangeiros. A equipe ficou duas janelas inteiras sem poder efetuar uma contratação sequer. A juventude floresceu.

E aqui, outro ditado popular se encaixa perfeitamente: há males que vem para bem. Se antes La Masia (Barcelona) e as categorias inferiores do Ajax revelavam talentos aos montes, hoje o atual campeão europeu não só aproveita suas melhores peças como também lucra com elas. Christensen, por exemplo, que tem parte da sua formação em Cobham, é alvo de gigantes europeus.

Tammy Abraham, atualmente na Roma, só chamou atenção de outras equipes no Velho Continente por conta do desempenho de destaque ainda na curta era de Frank Lampard na área técnica de Stamford Bridge. Sam Page, analista de performance das categorias de base dos Blues, explicou qual motivo resulta no sucesso dos jovens do clube: trabalho duro.

"Eu lembro de quando Reece e Mason faziam horas extras para melhorarem sua condição técnica. Todo o esforço que eles faziam era um exemplo para os outros. Sempre foram talentosos, é claro, mas mostram que é necessário se dedicar para chegar ao nível profissional"

Sam Page, à Goal

Para Jamie Spencer, do 90min Football, a evolução das categorias inferiores iria acontecer de forma natural, independente da punição da Fifa: "A proibição de transferência foi uma porta de entrada para o time titular em particular, mas era provável que houvesse um avanço maior em algum momento por causa do que estava acontecendo nos bastidores", explicou.

Thomas Tuchel Mundial de Clubes Chelsea Palmeiras
Tuchel ficou conhecido nos gramados ingleses pela capacidade estratégica / Robin Jones/GettyImages

"Houve um grande investimento nas equipes juvenis do Chelsea por anos, o que produziu muito sucesso nas competições juvenis", completou o jornalista. Entre 2015 e 2019, os Blues chegaram à quatro finais da Uefa Youth League, a principal competição europeia de clubes da categoria sub-19. A equipe venceu duas dela de forma consecutiva - 2014/15 e 2015/16.


Um lançamento longo de Mason Mount deixou Kai Havertz em condições de tirar Ederson do caminho para estufar a rede. Agora Thomas Tuchel e seus comandados partem em busca de outra conquista: Mundial de Clubes. Tudo começa nesta quarta-feira (9), em duelo contra o Al-Hilal, às 13h30 de Brasília. Quem avançar enfrenta o Palmeiras no sábado (12).