Time grande não cai? O apequenamento de clubes populares é uma derrota para o futebol

Botafogo e Vasco se enfrentarão na Série B de 2021.
Botafogo e Vasco se enfrentarão na Série B de 2021. / Buda Mendes/Getty Images
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Atolado em dívidas que já somam quase 1 bilhão de reais, o Cruzeiro conseguiu a proeza de permanecer na Série B após o rebaixamento inédito na temporada retrasada. Para provocar o maior rival, o Atlético-MG postou nas redes sociais: “Time grande sobe!”. Uma resposta às brincadeiras de cruzeirenses que, desde 2005, quando o time alvinegro desceu para a segunda divisão, diziam que “time grande não cai”. Naquela época, o Atlético voltou à Série A no ano seguinte.

Depois da queda do Cruzeiro, restam apenas Flamengo, Santos e São Paulo na galeria dos clubes que nunca caíram no Brasileirão. Assim como o clube mineiro, o Fluminense foi rebaixado em 1997 e, um ano depois, chegou ao fundo do poço ao disputar a Série C. Nem por isso deixou de ser grande. Ergueu-se do baque ao conquistar a Copa do Brasil, em 2007, e mais dois campeonatos nacionais.

Faz parte da cultura do torcedor zombar de rivais em períodos de baixa, e não há nada que desabone a postura de atleticanos ao revidar as gozações que sofreram ao longo de quase 15 anos dos cruzeirenses. Problema é acreditar que o apequenamento de clubes populares seja medido somente pelo desempenho esportivo, ou que a derrocada de gigantes faça bem ao futebol. Botafogo, lanterna do Brasileirão, e Vasco, que está virtualmente rebaixado (quarta queda em 12 anos), terão dificuldades com receitas menores em 2021, mas não perdem apelo simplesmente por disputar uma divisão inferior.

Os clássicos regionais ainda mobilizam milhões de torcedores. Ter um grande rival local é benéfico não apenas para perpetuar rivalidades, mas para a receita dos clubes. Quando um time de massa deixa a elite do Brasileiro, seu valor de mercado diminui. A divisão do bolo, dos direitos de TV às cotas de publicidade, tende a encolher. O fortalecimento de equipes médias e pequenas depende da distribuição mais igualitária de recursos, não da falência dos maiores.

Torcida do Cruzeiro lamenta rebaixamento em 2019.
Torcida do Cruzeiro lamenta rebaixamento em 2019. / DOUGLAS MAGNO/Getty Images

Apesar do estado crítico nas finanças de clubes como Botafogo, Cruzeiro, Fluminense e Vasco, o Brasil ainda conserva seu grupo dos “12 grandes”. Que, se respeitada a tradição dos gigantes fora do eixo, poderia contar com pelo menos outros sete (Bahia, Ceará, Fortaleza, Náutico, Santa Cruz, Sport e Vitória). Suas torcidas seguem resilientes, não se deixam dobrar por rebaixamentos ou jejum de títulos nem pela penúria financeira.

A grandeza de um clube se mede pela capacidade de resistir ao tempo, de engajar novas gerações de torcedores, renovar seus quadros administrativos e manter viva sua história, sobretudo nos momentos inglórios. O declínio de instituições populares, por mais que aguce troças entre rivais, favorece apenas o estabelecimento de campeonatos polarizados, restritos a poucas e, cada vez mais concentradas, forças hegemônicas. Se qualquer um dos grandes desaparecer, será uma derrota implacável para o futebol brasileiro.